domingo, 15 de novembro de 2009

Poema das cinzas

Poema das cinzas,
jogado no canto inútel e imundo da noite,
queimado pelo isqueiro do cigarro,
e levado pelo vento,

Poema das cinzas,
não renasce ?
igual ave de esperanças...

Indagação sobre a santidade da guerra


Allah, o paraíso,
David, estrela de Israel
Cristo, sofrimento, sua cruz
Lutero, sua luz

Astros, caiam por terra!
Christi, sua cruz
Corpus, por quê?

A Vendedora de Doces


Quem já esteve naquela estação, certamente se deparou com uma pitoresca antítese visual. Lembrarão que lá há uma senhora, de rosto sofrido, cabelos grisalhos e olhar triste, típico de pessoas que padecem de todos os infortúnios da vida, e, simplesmente, não conseguem converter tanta amargura em simpatia. Se lhe vêm a cabeça a figura da vendedora de doces, então entendem bem o que digo. Você se lembrará que a pobre criatura estará sentada, com um livro - desses de romance de bancas de revista.
Se você também ficou com muita raiva porque tal senhora não lhe atendeu bem, então deve relevar, pois, para tudo há uma razão.

A vida foi um pouco ingrata com aquela mulher e é certamente por isso que a pobre alma andava angustiada. Também me senti assim, leitor, mas como trabalhava próximo à estação - e gostava de um tipo de doce que a senhora vendia-, então me conformava com aquele olhar colérico e sem vida daquela pobre mulher. Tentava em vão puxar conversa pra tentar arrancar-lhe um sorriso, não importava que fosse apenas por um segundo. Era ela dura na queda, fitava-me como se fosse um invasor que tentasse roubar-lhe algum pertence. Era mestre em interromper conversas e ir direto ao ponto. Foram longos anos que me confrontei com tal senhora, tentando, em vão, descobrir a razão de tanta amargura. Ironicamente, vendia doces, e era tão salgada!

Acredito que isso tenha acontecido em novembro, pois era época daquelas formigas voadoras saírem de seus esconderijos. Pois bem, estava saindo do trabalho e chego à estação. Lá, as pessoas estavam perplexas com a cena. A mulher vendedora de doces estava jogando, ou melhor, arremessando marias-moles por todos os lados. Imagine uma guerra de marias-moles! Uma doce guerra infantil! Por pouco não recebo um desses doces no rosto. Cuidadosamente, o guarda puxa a mulher para dentro da cabine e não se soube mais nada.

Misteriosamente, na outra semana, lá estava a tal senhora sentada, lendo seu livro e vendendo seus doces, como nada tivesse ocorrido. Mas, com um detalhe: as marias-moles haviam sumido! Corri para comprar doces e me deparei com o de sempre: um rosto amargo e triste, sem vontade, que me entregara meus doces e me disse com o olhar: cai fora!

Por ironia do destino - acho que isso ocorreu em dezembro – acabei conhecendo Joana, irmã da senhora vendedora de doces. Não que tivesse correndo atrás para saber alguma coisa, mas tais acontecimentos me intrigavam muito. Imaginei que era o momento para se entender tudo, pois, de uma hora para outra, tal senhora sumiu da estação e outra pessoa apareceu em seu lugar. Não me julgue, leitor! Não estou aqui para fazer fofocas, mas apenas para lhe falar sobre tal senhora, que, acredito eu, deve estar mordido de curiosidade. Se não quiser continuar, favor fechar o livro e ir cuidar dos seus afazeres. Mas, se quiser prosseguir, então me acompanhe...

Como havia dito, o nome da irmã da vendedora de doces era Joana. Belo nome, que nunca esquecerei! Joana estava indo para o trabalho e eu, ao meu. Estávamos no metrô. Como ela desceria no centro, pude bater um bom papo com ela. Era uma pessoa alegre, de bem com a vida. Disse que estava feliz porque a irmã havia resolvido seu problema. Neste ponto não sabia que era irmã da senhora vendedora de doces, mas como eu disse que desceria naquela estação, ela havia me contado que tinha uma irmã que trabalhava nela e que havia mudado de ramo. Contei que havia conhecido a irmã porque era seu freguês. Ela sorriu e me disse:

─ Ah, então você conhece a amarga da minha maninha! Deve ter passado maus bocados com ela!

Tentei ser simpático e dizer que não, mas ela já se antecipou dizendo que tudo que dissesse seria somente pra ser simpático. Pediu-me segredo e finalmente me contou: O marido tinha impotência! Disse que a doce guerra de marias-moles era porque os pobres doces lembravam-na do marido. Não pedi mais detalhes. - Um pingo pode ser a letra inteira-. Agora estava tudo bem! O marido havia feito um tratamento e voltava à ativa. Disse-me que a pobre mulher abriu uma lanchonete de salgados. Achei a notícia muito interessante. Se vendendo doces lhe tornava salgada demais, então, agora, vendendo salgados, como seria?

Pedi o endereço do estabelecimento e fui conferir pessoalmente. Era uma loja simples, limpinha e organizada. Entrei finalmente! Para minha surpresa, era outra mulher que saía de lá: cabelos bem penteados, boca pintada, unhas bem feitas. Era uma mulher totalmente diferente. Estava feliz, simpática e transcendente. Era o poder de Eros, dominando-a. Era tudo novo...

Encontro Celeste


Naquela noite de sábado a lua estava lá, com seu sorriso amarelo mais as estrelas, a muito tempo, jaziam cobertas pelas nuvens imundas da poluição. Tudo muito confuso , vivemos a busca de um refúgio, um paraíso, que está distante de nossos recursos de proletário. Belezas mil que contam aos olhos os "outdoors", mas só deleitam àqueles que possuem o mel capitalista.

Era naquela noite, num vagar pela noite, ali próximo ao altar de Iemanjá, que vi seguidores de Iemanjá, a lhe devotar presentes e devoção divinal. Meu olhar direcionava-se às águas da lagoa, com aquele cheiro forte e nauseante, fugindo da minha própria consciência. Era onde os esgotos dos ricos chegavam. Era também onde os homens ricos jogavam suas cópias!

Iemaja estava lá, aquela imagem de pedra, parada um pouco à frente da lagoa, com a estrela na cabeça e com um olhar triste, frio, indiferente.

Reduzida a um espaço infimamente menor do que o era costumada, petrificada; era um grão de areia naquela lagoa.Mas ali, no meio da lagoa, reduzia-se sua totalidade!O mar trazia a maior diversidade de animais do planeta. Teria lá segredos há muitos tempos guardados e inimagináveis. Cores nunca vistas aos olhos dos humanos. O mar e suas verdades. Verdades aparentemente diversas, inúmeras águas que na verdade são apenas uma coisa só.

Já eram 10 horas quando meu transe sobre o qual me coloquei foi quebrado. Um reboliço de homens de terno e mulheres de cabelos e saias longos. Gritavam furiosos, como búfalos ferozes, ao encontro dos adoradores de Iemanjá. Invadiam o pequeno templo fazendo sua presença .

Eram homens e mulheres, bufalos ferozes, com o desejo ensano de destruir aquele local. Eu na crença democracia estava em estado de choque. Aquilo era insano demais para mim.

Gritavam , cânticos cantavam, rituais de purificação faziam. Traziam pedras para arremessar em direção à pobre da imagem.

Foi em questão de minutos que o local foi tomado. Foi correria para todos os lados. Gente correndo com medo daqueles bufalos com o livro na mão. A espada, diziam eles. Foi nesse momento que um homem de bom porte físico, veio na minha direção, jogando-me longe, sem quase menor esforço. Bati a cabeça no chão! Fiquei no chão, sem condições de me levantar, apenas olhando do chão. Minha cabeça rodava como se estivesse bêbado ou coisa assim. E presenciaria a destruição imoral daquela mulher de pedra, já triste, no meio da lagoa. Imóvel veria minha democracia se fazer em pedaços. Quando, não sei se foi um sonho. Surrealismo produzido por uma mente afligida do pânico? Não sei ao certo, mas estava o líder daqueles homens com uma pedra na mão. E estavam acabando o “ritual de purificação”,quando sai, andando sobre as águas da lagoa, um homem. O lua o seguia assim como as estrelas. Era um homem iluminado. A imagem petrificada! Uma mulher a imagem havia transformado. Pálida estava a mulher com adornos feitos com coisas do mar. Vestido azul, cabelos negros e olhos castanhos brilhantes. Chorava, paralisada. Levaria a pedrada e seria ofendida. Mas o homem que andava sobre a água aproximava. Era alto, de aspecto moreno, cabelos ondulados, barba de tamanho médio. Aquele homem tinha um aura de paz e tranqüilidade que reluzia. Trazia as feridas na mão!

Colocou-se à frente da mulher. Olhou com um ar sério para o homem que trazia as pedras. Calou-se o homem que andava sobre as águas. Você é uma aparição demoníaca, disse o homem de preto. Essa pedra está abençoada. O homem de manta branca apenas disse: “Se você tiver erros, seja aquele a não arremessar a pedra”.

Olhou o homem de terno com fúria e no momento de arremessar a pedra, a mesma converteu-se em algo parecido com merda. O braço do homem de terno ficou imóvel fazendo com que aquela coisa pastosa escorresse na sua camisa. Ficou confuso e por fim saiu correndo com os demais. Acovardou-se com a figura transfigurada do homem moreno da lagoa.

O homem transfigurado olhou com ternura para a mulher e saiu andando para o meio da lagoa, sumindo por completo no meio da escuridão. A mulher apenas sorriu e disse: “Gosto desse homem. Ele tem um ar de extrema bondade, mas não entendo porque os homens que o seguem sejam tão ruins. Talvez por que sejam homens imperfeitos. Eles merecem perdão!”.

Converteu-se a mulher a pedra de novo. Senti que meu corpo estava são. Estranho, estava como tivesse sido curado. Sai correndo daquele lugar vazio. Hoje conto essa história as pessoas, mas elas não acreditam em mim. Para onde foi aquele homem de terno? Onde está o homem que andava sobre as águas?